quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

Notícias de ontem...

Depois do tradicional período de "vacas magras" de notícias durante as festas de final de ano, os noticiários voltaram com tudo nesse início de ano. Pelo menos é como tem sido aqui na Itália.

Ontem, a grande notícia foi a desistência do Papa em participar da aula inaugural da universidade La Sapienza, de Roma. Ele havia sido convidado pelo reitor e pelo senado acadêmico para proferir o discurso de abertura dos trabalhos de 2008 mas, frente ao protesto imediato de uma parcela considerável de alunos e professores, anunciou ontem que mudava de idéia.

Reações imediatas da política, tanto dos setores de direita quanto de esquerda. Ambos lamentam a falta de diálogo em uma instituição que deveria primar, justamente, pela abertura ao diálogo. Foi mais ou menos esse o tom das declarações do governo, começando pelo próprio Presidente do Conselho, Romano Prodi, ele mesmo professor universitário. Já a direita, sobretudo os esbravejadores conservadores, foram além. Para eles, a juventude atual está perdida, sem fundamento de valores morais. A declaração mais raivosa veio de Giuliano Ferrara, político e jornalista que, em um inexplicável "tilt" ideológico, se converteu ao "neoconservadorismo" após uma juventude comunista de líder estudantil nos anos 60. Ainda ontem, ele disse que agradecia por não ter concluído a laurea pela La Sapienza pois, se houvesse, teria de enviar o diploma de volta ao reitor, acompanhado de uma série de declarações pouco respeitosas sobre a capacidade cognitiva dos professores da instituição.

Porém, fizeram-se ouvir mais alto as numerosas vozes de alunos e professores que defendem, em primeiro lugar, o caráter laico da universidade, sua posição independente como centro formador de conhecimento, sobretudo científico. Cada um em seu devido lugar ou, como declarou um dos professores revoltados, "o Papa não me convida para ensinar Darwin na sua igreja na missa de domingo, porque nós deveríamos convidá-lo para pregar na aula inaugural?".

Mas, talvez mais importante, a insatisfação explosiva de Roma possa estar relacionada, embora não declaradamente, com a percepção de que, sob a guia de Benedetto XVI, a Igreja vem se posicionando cada vez mais contra o saber científico estabelecido. A fé cega, que não discute nem questiona, tem ganhado espaço e apoio do Papa-Teólogo. Ou seja, talvez o protesto laico em Roma seja mais uma reação do que uma ação, um contra-ataque da comunidade científica contra as pretensas ingerências da Igreja. Isso, porém, poucos comentam, menos ainda os políticos, interessados em manter sua bella figura frente a uma maioria católica, ainda que moderada, de eleitores em um país que definitivamente ainda é guiado pela religião e suas ramificações sociais e culturais. Até a grande imprensa reluta em apoiar, mesmo que indiretamente, os descontentes, conforme se nota neste editorial do La Repubblica. Nesta manifestação, assim como em outras, abundam termos como "intolerância", "medo", "recusa ao diálogo" e "censura". Palavras que, ao menos aos meus ouvidos, soam muito mais adequadas à postura histórica da Igreja do que àquela da Ciência. Em resumo: o Papa ganhou o posto de vítima do momento, e deve aproveitar.

Mas essa foi a notícia de ontem. Amanhã, as notícias de hoje!

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